
Home Care pelo Plano de Saúde:
14 de maio de 2025
Imóvel HMP com Restrições Não Informadas: Seus Direitos e Como Agir em São Paulo
7 de julho de 2025Introdução:
A globalização e a crescente mobilidade internacional têm levado muitos brasileiros a construir patrimônios além das fronteiras nacionais. É cada vez mais comum encontrar famílias com imóveis em Miami, contas bancárias em Portugal ou investimentos em Dubai. Dados recentes ilustram essa tendência: brasileiros representam uma parcela significativa da população estrangeira em Portugal e são grandes compradores de imóveis na Flórida.
No entanto, a dissolução de uniões – seja por divórcio internacional ou falecimento – revela uma complexidade jurídica substancial, especialmente no que tange à partilha de bens no exterior. Este artigo da Feldmann Advocacia não apenas delineia os principais entraves enfrentados nesse cenário, mas também apresenta soluções práticas e estratégias eficazes para garantir a efetivação da partilha transnacional.
O Desafio da Jurisdição Internacional e os Limites da Sentença Brasileira
A base do direito internacional privado é o princípio da soberania territorial, que restringe a eficácia de decisões judiciais brasileiras fora do país. O Código de Processo Civil (CPC), em seu Art. 23, II, é claro: a jurisdição brasileira é competente para inventários e partilhas apenas de bens localizados no Brasil, mesmo que o falecido seja estrangeiro. Essa limitação é aplicada analogicamente em processos de divórcio: uma sentença brasileira de divórcio não tem efeito imediato para alterar a titularidade de imóveis no exterior ou ativos financeiros internacionais. Para isso, é imprescindível o posterior reconhecimento e execução pelas autoridades estrangeiras competentes.
A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) reforça essa limitação territorial, estabelecendo que os direitos reais sobre bens imóveis são regidos pela legislação do país onde o bem se encontra (lex rei sitae). Assim, embora o juiz brasileiro possa dissolver o vínculo matrimonial e reconhecer direitos patrimoniais, a transferência efetiva de propriedades fora do Brasil, como um apartamento em Miami ou uma conta bancária em Lisboa, exige a validação das jurisdições locais.
Partilha de Imóveis no Exterior: Impossibilidade Direta e os Caminhos Necessários
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou o entendimento de que sentenças brasileiras que determinam a partilha de imóveis em outros países não possuem eficácia extraterritorial por si só, fundamentado na soberania e na lex rei sitae (Art. 10 da LINDB).
Diante disso, o processo de partilha de imóveis no exterior geralmente envolve três etapas cruciais:
- Obtenção da sentença de divórcio brasileira que reconheça os direitos dos cônjuges sobre o bem.
- Homologação da decisão brasileira no país onde o imóvel está localizado (por exequatur ou procedimento equivalente).
- Propositura de ação local para a efetiva transferência da propriedade junto ao cartório de registro de imóveis ou órgão competente estrangeiro.
Por exemplo, para a transferência de imóvel em Orlando (EUA), a sentença brasileira deve ser apostilada (segundo a Convenção de Haia), homologada judicialmente na Flórida e, em seguida, apresentada ao County Recorder para a lavratura da escritura de transferência (quitclaim deed). Em Portugal, além da homologação, há o Imposto de Selo (0,8% do valor venal do imóvel) para o registro da transferência, gerando um custo adicional.
Contas Bancárias e Ativos Financeiros Internacionais: Nuances e Possibilidades
Diferentemente dos imóveis, ativos financeiros no exterior, como contas bancárias, ações e fundos de investimento, não são considerados direitos reais. Isso permite que, em alguns precedentes, a partilha direta desses ativos seja admitida na própria sentença de divórcio brasileira, desde que devidamente comprovados e identificados.
Contudo, persistem desafios, como o sigilo bancário e a necessidade de ordens judiciais locais para obter informações ou bloquear ativos junto a instituições financeiras estrangeiras. A cooperação jurídica internacional torna-se, então, essencial, podendo ocorrer via cartas rogatórias ou tratados específicos, como o Mutual Legal Assistance Treaty (MLAT) entre Brasil e EUA, embora esses procedimentos possam ser demorados.
Avanços recentes, como o Common Reporting Standard (CRS), adotado pelo Brasil em 2018, facilitam o acesso automático da Receita Federal a informações sobre contas bancárias em mais de 100 países (incluindo Portugal e EUA), oferecendo um importante suporte probatório em demandas de partilha.
Homologação de Sentenças Estrangeiras no Brasil (STJ)
Quando o divórcio ocorre no exterior e envolve bens localizados no Brasil, a sentença estrangeira precisa ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) para produzir efeitos legais em território nacional. Os requisitos (Art. 961 a 965 do CPC) incluem: decisão definitiva, citação válida das partes, tradução oficial e ausência de ofensa à ordem pública brasileira.
É importante notar que o STJ pode rejeitar a homologação se a partilha estrangeira violar normas de ordem pública nacional, como a legítima herança prevista no Art. 5º da Constituição Federal (garantia de 50% ao cônjuge brasileiro).
Estratégias e Soluções Práticas para a Partilha Internacional
Diante dos desafios da partilha de patrimônio internacional, algumas estratégias são recomendadas pela Feldmann Advocacia para mitigar riscos e evitar litígios prolongados:
- Pactos Antenupciais com Cláusulas Transnacionais: Incluir cláusulas que prevejam a lei aplicável (ex: lei da Flórida para bens nos EUA) e a eleição de foro (ex: tribunais de Lisboa para bens em Portugal). Embora o direito brasileiro limite sua eficácia sobre bens futuros no exterior, muitos países (Europa, EUA) costumam respeitá-los.
- Acordos Extrajudiciais Bilaterais: Elaborar um acordo de divórcio consensual detalhando os bens no exterior, que possa ser ratificado por um tribunal estrangeiro e executado localmente.
- Atuação Coordenada com Escritórios Internacionais: Conduzir o processo em fases: divórcio no Brasil com identificação dos bens, ação específica no país dos ativos e, se possível, compensação financeira cruzada, onde cada cônjuge recebe bens integrais em diferentes jurisdições.
- Uso de Convenções Internacionais: Tratados como a Convenção de Haia sobre Obtenção de Provas no Estrangeiro facilitam a coleta célere de documentos e informações, substituindo cartas rogatórias.
Conclusão:
A complexidade da partilha de bens no exterior em divórcios de brasileiros exige assessoria jurídica especializada em direito internacional privado. O planejamento patrimonial preventivo, como a constituição de holdings ou trusts para centralizar ativos, e a busca por harmonização legislativa internacional são fundamentais.
Com o aumento expressivo dos investimentos brasileiros no exterior, é crucial ter a ciência de que, “onde os bens estão, lá está a solução”. A Feldmann Advocacia está preparada para oferecer a atuação estratégica e preventiva necessária para garantir a efetividade e a segurança jurídica na partilha de patrimônios internacionais.




